25 janeiro 2018

 

A questão do diferendo entre Portugal e Angola


Tem-se dito (na rádio, na TV, nos jornais) que a questão que se levanta entre Portugal e Angola por causa do processo que envolve o que foi vice-presidente deste último país e um ex-Procurador-Geral-Adjunto português é uma questão estritamente juridica, mas não é. Do meu ponto de vista, é até primacialmente política.
Na verdade, o que parece estar em causa é uma questão de afirmação da soberania das jurisdições penais de cada um dos países. Portugal, por intermédio das autoridades judiciárias, reivindica o direito de julgar o cidadão angolano em nome do princípio territorial: o crime ou crimes objecto da acusação foram praticados em território nacional. Prescreve o art. 4.º do Código Penal: «Salvo tratado ou convenção internacional em contrário, a lei penal portuguesa é aplicável a factos praticados: a) Em território português, seja qual for a nacionalidade do agente»…
Por seu turno, o Estado de Angola arroga-se o direito de julgar o cidadão angolano que foi vice-presidente, em nome de um outro princípio: a nacionalidade do agente. Ora, este princípio também é válido para a ordem jurídica portuguesa, visto que o art. 5.º, n.º 1 do CP, dispõe o seguinte: «Salvo tratado ou convenção internacional em contrário, a lei penal portuguesa é ainda aplicável a factos cometidos fora do território nacional:
a) …
b) Contra portugueses, por portugueses que vivam habitualmente em Portugal ao tempo da sua prática e aqui forem encontrados.
Nada de espantar, por isso, que Angola reivindique para si um princípio idêntico.

A questão da independência do poder judicial tem a ver com outra coisa: a não interferência de qualquer outro poder do Estado ou seja de quem for nas decisões judiciais. E, nesse campo, as autoridades judiciárias portuguesas podem decidir não transferir para outro país o processo relativo a um nacional desse país. Porém, ao fazê-lo com o fundamento de que não confiam na justiça desse país, podem ter boas razões para isso, nomeadamente no que diz respeito à expectativa de não perseguição eficaz do crime em causa, mas o que é certo é que esse juízo encerra uma apreciação negativa de carácter político da justiça desse país, pois não será o aspecto técnico-jurídico que está em causa.





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