14 maio 2011

 

Que posso dizer?


O que é que posso dizer, sem cair na banalidade das celebrações, na expressão de sentimentos carregados de um vazio retórico ou nos elogios mais ou menos óbvios, de um amigo que acaba de ganhar o maior galardão atribuído a escritores do âmbito da lusofonia – o prémio Camões?
Nada, a não ser repetir as suas próprias palavras, na difícil arte poética da decifração do mundo, da existência, da nossa própria identidade, na busca talvez impossível de uma língua original:

Arte poética

Vai, pois, poema, procura
a voz literal
que desocultamente fala
sob tanta literatura.

Se escutares, porém, tapa os ouvidos,
porque pela primeira vez estás sozinho.
Regressa então, se puderes, pelo caminho
das interpretações e dos sentidos.

Mas não olhes para trás, não olhes para trás,
ou jamais te perderás;
e teu canto, insensato, será feito
só de melancolia e de despeito.

E de discórdia. E todavia
sob tanto passado insepulto
o que encontraste senão tumulto,
senão de novo ressentimento e ironia?

(Manuel António Pina, Os Livros)





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