31 março 2011

 

Geração à rasca

Circula por aí um texto atribuído ao escritor moçambicano Mia Couto, intitulado “Geração à Rasca – A Nossa Culpa”. Chegou à minha esfera de conhecimento via correio electrónico, com o sobretítulo “REALIDADE”. Assim mesmo – em letras garrafais. Imprimi-o para melhor o ler. Não me revi nesse texto, que sobretudo procura traçar o retrato de uma certa camada jovem, sobreprotegida, com habilitações académicas, mas fundamentalmente inculta, consumista, caprichosa, egoísta, desadaptada, anti-solidária e perigosamente ambiciosa. No fundo, trata-se de glosar o tema da célebre “geração rasca” (expressão cunhada por Vicente Jorge Silva), considerando como tal, globalmente, as gerações (pois são várias) que provieram dos pais que têm hoje entre 30 e 50 anos, omitindo que uma grande parte dos jovens, filhos dos pais não só com 30 e 50 anos, mas mesmo mais velhos (com 60 e mais anos, como é o meu caso) são efectivamente vítimas da situação actual. De mais, o texto assume, na parte final, um tom pretensamente indulgente e paternalista, atribuindo as culpas de tudo o que os jovens de hoje supostamente encarnam aos próprios pais, ou seja às gerações mais velhas, que as não souberam educar convenientemente: «A culpa de tudo isto é nossa, que não soubemos formar, nem educar, nem fazer melhor…». Todavia, não deixa de alertar em tom patético: «E nós, os mais velhos, estaremos em vias de ser caçados à entrada dos nossos locais de trabalho, para deixarmos livres os invejados lugares a que alguns acham ter direito …» É esta a parte mais perversa do texto. Como desconfiasse do seu teor e, sobretudo, da sua autoria, cuja ideologia, mais ou menos reproduzindo a de outras intervenções de teor semelhante, é traída por algumas expressões, conceitos e intenções sub-reptícias, nomeadamente a já referida da parte final, andei pela Internet à procura de uma senda que me elucidasse, tendo deparado com uma série de comentários, alguns deles negando a autoria e afirmando mesmo que Mia Couto, no Facebook, a havia repudiado. Mas, já agora, leia-se o texto, que tanta gente recomenda como de leitura obrigatória (oh, santa ingenuidade!), e ajuíze-se. Procure-se na Net: «Geração à rasca – A nossa culpa.

30 março 2011

 

Líbia: proteger os rebeldes, não os civis

É hoje claro e evidente que a intervenção dos "aliados" (palavra tão bela!) nunca teve como objectivo proteger "civis", mas sim preparar o terreno, por meio de bombardeamentos das posições do exército ofiial, à progressão e vitória do exército rebelde. Uma violação frontal da Resolução nº 1973 do CS da ONU, mas isso é irrelevante para os ditos "aliados".
O problema é que os rebeldes não parecem em condições de vencer militarmente... Será preciso porventura ir "lá baixo" ao terreno. Isso está expressamente vedado pela dita resolução, mas também seria irrelevante, se não fosse a pouca vontade dos "aliados" de descer ao terreno...
Enfim, uma embrulhada difícil de desembrulhar...

 

Encontros "one to one"

Quando um político tem "má imprensa", tem um recurso à mão. Há aí uma agência que "promove" encontros "one to one" (preciosidade anglo-saxónica!) entre o dito e colunistas e jornalistas, com o fim de "contrariar a imagem negativa"...
Tudo se compra, tudo se vende. É um nojo.

29 março 2011

 

Duas coisas

Soube-se hoje que a Assembleia da República não vai celebrar este ano o "25 de Abril", por causa da eventual dissolução do Parlamento. Portanto, o "25 de Abril" vai desaparecer da Assembleia, pelo menos este ano. Na prática, o "25 de Abril" já está muito longe, já é coisa remota e, provavelmente, não faltará quem o queira varrer definitivamente das celebrações oficiais do Parlamento. Será que este incidente se vai transformar num precedente?

Mais uma testemunha fundamental do processo "Casa Pia" veio "retratar-se" publicamente. Por este andar, um dia ainda se vai escrever um livro cujo título será:"O processo Casa Pia nunca existiu".

 

Grau zero - adenda

Há dias atrás, num "post", que intitulei "grau zero", troquei o nome de José Gil pelo do seu irmão já falecido, o filósofo Fernando Gil. Quem me chamou gentilmente a atenção para o lapso foi Paulo Dá Mesquita, a quem fico muito grato, por dois motivos:por ver que lê com atenção o que aqui se escreve e por contribuir para a reparação dos erros dos nossos escritos.
Efectivamente, quem escreveu o artigo da "Visão" que referi foi José Gil. Troco muitas vezes os nomes destes dois irmãos, ambos filósofos de grande envergadura. Fernando Gil é, talvez, mais complexo para mim. Dele li, duas obras com interesse também para juristas: "A Convicção" e "Provas".
Aqui fica a reparação do lapso.

28 março 2011

 

"Dia de raiva" em Londres

Não são muito vulgares as manifestações em Londres. Povo ordeiro e pacífico, foi preciso vir o Tony espicaçá-lo e obrigá-lo a sair à rua contra um governo (o dele!).
Agora parece que foi ainda melhor (pior para o governo conservador). Num nítido plágio das manifestações da "rua árabe", meio milhão de ingleses, provenientes de variados estratos sociais (estudantes, pensionistas, trabalhadores do sector privado e - pasme-se - do sector público), vieram para a rua, proferindo palavras de ordem subversivas, como "não aos cortes" e "defendam os nossos serviços públicos" (que já motivaram uma reprimenda telefónica incisiva de Angela Merkel a Cameron), e, não contentes, enfrentaram a polícia, provocando desordens várias, que obrigaram a polícia a prender duzentos desordeiros (pagos por Khadafi, como confessaram à polícia).
O Cairo em Londres, assim se pode dizer. Quem diria!

 

"Casa Pia": mais um episódio

A novela paralela que decorre na imprensa apresentou mais um episódio escaldante: a reviravolta de mais uma testemunha. Não será certamente o último. Embora já comece a cansar...

 

Democracia em alta

No Sporting é que a democracia está em alta. Eleições muito concorridas, grande animação, um verdadeiro interesse pela causa. As notícias, na rádio, abrem com esse acontecimento patriótico; os telejornais dedicam-lhe grande espaço. A avaliar pelo destaque e pelo tempo consagrado nos media, este é um acontecimento tão ou mais importante que a dissolução do Parlamento e as eleições que aí vêm. Há muito que o futebol foi guindado ao primeiro plano das matérias de interesse público. Muito pelo esforçado empenho dos órgãos de comunicação social. Não há última página do «Público», para só mencionar um exemplo, que naquele “sobe e desce” não mencione um acontecimento político a par com um de natureza futebolística, colocando-os no mesmo campo ou no mesmo estádio de interesse.

25 março 2011

 

Talvez até abaixo de zero...

Receio bem que caminhemos, se não estamos já, para um grau abaixo de zero, caro amigo Artur... (Nas finanças, estamos certamente muitos milhões...). Mas o pior é esta "apagada e vil tristeza" que já Camões bem conheceu.
As anunciadas eleições, que deveriam ser sempre uma data de júbilo (tantos anos eastivemos privados delas...), parecem-me agora quase uma ida ao matadouro... Que iremos lá fazer? Não vem de lá mais do mesmo? Pior, pior: pior do mesmo... Que ideia foi esta da esquerda-esquerda de apostar no quanto pior melhor e assim atirar o poder para as mãos da direita? (Alguém se convence de que haverá uma maioria de esquerda em Junho? E, se acaso houvesse, que ela funcionasse como tal?)
Agora já nem se fala de luz ao fundo túnel... O túnel não tem saída, entranha-se cada vez mais no interior da terra...
"Lasciate ogni speranza, voi ch'entrate", disse o Dante que estava escrito à porta do Inferno (já estou a repetir-me, mas não sou eu, é o país!). Assim estamos nós.

23 março 2011

 

O grau zero

Que dizer numa altura destas? Nada, a não ser ficar suspenso ou perplexo (ou as duas coisas ao mesmo tempo). Como escreveu Fernando Gil na Visão da quinta-feira passada, nós não sabemos nada; estamos às escuras; não podemos ou não sabemos como agir. Falta-nos informação do que é essencial, porque, para além do mais, atingimos quase o grau zero da democracia, em que as decisões são tomadas nas nossas costas, em instâncias internacionais. Talvez por isso, por causa dessa perplexidade que nos toma, dessa expectativa quase patológica, dessa espécie de fatum com que aguardamos o desenrolar dos acontecimentos, não nos apeteça fazer nada (nem sequer escrever), quando devíamos era revoltarmo-nos.

13 março 2011

 

Um "requiem" do 25 de Abril?

A dimensão grandiosa das manifestações de ontem deixaram todos surpreendidos, até os organizadores... Para além do número impressionante dos manifestantes, também impressionou a diversidade dos participantes, quanto à idade, à profissão, à situação profissional, à posição social, etc.
Para tanta gente sair à rua em várias cidades do País, de Norte a Sul, algo de grave se está a passar, ninguém pode ter dúvidas (embora as manifestações tenham também tido algo de lúdico para muitos, mas essa faceta também está geralmente presente nas manifestações políticas).
Mas há qualquer coisa de amargo neste movimento. De amargo e perigoso. Este protesto contra a "precariedade" e os "políticos", sem programa, sem objectivos políticos, escape de muitas frustrações, só pode conduzir a outras frustrações ainda mais fortes se não encontrar um programa definido de luta. Pode conduzir até ao aparecimento de movimentos "messiânicos" em torno de "chefes" carismáticos. Pode favorecer em qualquer caso as correntes reaccionárias "anti-regime", que vêm propondo a "refundação" do regime, isto é, no fundo, uma revisão constitucional que elimine os vestígios do 25 de Abril e altere as regras do sistema político num sentido presidencialista, autoritário (alterando o actual equilíbrio de poderes), e acabe com o Estado Social.
Mas a culpa da "precariedade" não é do regime, pois o que tem falhado, nestas dezenas de anos de 1976 para cá, é a política governativa, que não conseguiu distribuir melhor a riqueza, nem sequer conseguiu desenvolver Portugal, aproximá-lo da Europa, e o tornou completamente dependente dos parceiros mais fortes da UE.
A dependência é agora tão grande que nem vale a pena fazer manifestações cá, porque não é cá que as grandes decisões são tomadas. Sugiro aos organizadores que a próxima manifestação seja em Berlim.
A questão é esta: as manifestações de ontem, que foram? Um "sobressalto cívico" genuíno? Ou apenas um sintoma indefinido de mal-estar, tão indefinido que pode ser aproveitado para engrossar as fileiras dos que querem o "fim do regime" democrático e constitucional, tal como o conhecemos? Foram um "requiem" do 25 de Abril?

12 março 2011

 

Aviso na Quaresma


O Governo de Sócrates entrou na arena política como um touro embravecido a investir contra os privilégios das chamadas “corporações”, tentando aniquilar certos grupos profissionais de um modo cego, indiscriminado e demagógico. Semeou ventos e colheu tempestades, fingindo ignorar com arrogância as reacções maciças a que tal política, em alguns casos, deu lugar. Nunca atacou, porém, os privilégios das velhas classes dominantes e até deixou que, em muitas situações, eles recrudescessem ou se restaurassem. Fomentou algumas políticas ditas “fracturantes” (a questão do aborto, do casamento, dos homossexuais), para se pôr à la page com uma esquerda que via aí um novo filão de luta e um modo de manter acesa a velha chama revolucionária, mas porque tais questões não punham minimamente em causa os fundamentos de uma sociedade cada vez mais assente na mercantilização total e numa exploração que não tem agora, a tolhê-la, sobretudo depois da queda do Muro, nenhuma barreira ideológica e nenhum motivo para se retrair ou embuçar.
Com a chamada “crise”, foi então o fim. O fim do vilipendiado (por uns) e apregoado (por outros) Estado Social. As políticas adoptadas (os vários PEC) atacam sucessivamente as mesmas classes: os trabalhadores, os funcionários públicos, as classes médias, que vivem sobretudo dos rendimentos do seu trabalho. A música tem sido sempre tangida na mesma clave: salários, pensões, prestações sociais, ataque à saúde dos mais débeis com a drástica redução das comparticipações, impostos sobre impostos a incidirem sobre os rendimentos de quem trabalha e sobre o consumo de quem mais precisa. Os bancos (que muito contribuíram para a crise financeira) prosperam, afinal, com lucros que nos deixam de boca aberta; os numerosos institutos e fundações que foram criados para dar lautos empregos a clientelas partidárias, as empresas públicas, onde se refugiam muitos políticos retirados da política, cujos chorudos vencimentos a Assembleia da República (quer dizer, o PS e o PSD) se recusou a baixar, como em tempos permitiu a manobra da antecipação da distribuição de dividendos e a correspondente fuga aos impostos, permanecem intocados. Alguns (poucos) enriquecem como nababos, enquanto a maioria se atola na crise, empurrada para o fundo com sucessivos PEC.
Os jovens, claro, formam grande parte dessa espécie de “exército industrial de reserva”, à mercê das vicissitudes do sistema e à mercê dos caprichos dos chamados “empregadores”. As manifestações de hoje são um sinal, um aviso sério. Não são um carnaval. Muito menos agora, que estamos francamente a viver a Quaresma.

09 março 2011

 

Guantánamo: para lavar e durar

Guantánamo não vai fechar até ao fim do mandato de Obama. As comissões mlitares vão voltar, agora recauchutadas, e com regras "mais credíveis" (???). Guantánamo é cada vez mais uma peça essencial do "sistema".

 

Como os EUA tratam o inimigo interno

Bradley Manning, o soldado suspeito de passar documentos à WikiLeaks, e por isso declarado "inimigo" da nação americana, está metido desde Agosto de 2010 numa cela com 6 m2 (3 x 2 m), sem luz natural, 23 horas por dia. Até agora podia dormir com roupa interior. O regime foi agravado, vai ter que dormir nu, mas, argumentam os responsáveis prisionais, para bem do próprio (a hipocrisia é uma das grandes armas dos carrascos). Imagine-se o que é viver assim...
Mas há quem tenha assim vivido anos, muitos anos. Foi o que aconteceu a Robert King, um militante dos Panteras Negras, que agora veio ao Porto falar da sua experiência de mlitante... e de recluso.

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