20 dezembro 2010

 

Europa, crise e democracia

Acho importante transcrever um pequeno trecho de uma entrevista concedida pelo filósofo e pensador político Jacques Rancière a António Guerreiro na Revista “Actual” do Expresso do passado dia 11 de Dezembro e que só agora tive ocasião de reproduzir aqui.
Tem muito a ver com alguns textos que ultimamente tenho publicado neste blogue sobre a situação que atravessamos.
Eis:

JR – Na medida em que um Estado é político, ele deve referir-se a um poder que é o poder de todos. Mas, ao mesmo tempo, um Estado é sempre uma máquina oligárquica que tende a apropriar-se desse poder que é o poder de todos. O princípio é o de que o Estado representa o povo, mas o que o Estado faz é organizar os meios da sua própria reprodução. O que significa que continuamente o Estado suprime a política, ao mesmo tempo que se levantam as vozes dos que reclamam fazer parte da discussão, das decisões. E aí começa a política. A forma mais recente de o Estado nos impedir de participar na discussão e nas decisões consiste em dizer que ele próprio está numa situação que não lhe deixa o poder de escolher e em que há só uma solução.
AG – Esse é o actual discurso canónico da crise.
JR – Exactamente, o discurso que nos diz que há uma única maneira de sair dela. O Estado pratica então uma forma requintada de “deslocalização”. Da mesma maneira que as empresas se deslocalizam e vão instalar-se no estrangeiro, assim o Estado expatria os seus centros de decisão para o estrangeiro. O que é a Europa? É uma forma de deslocalização do Estado, encarnação do poder mundial anónimo da necessidade económica. A Europa apresenta-se simplesmente como o império da necessidade económica… como a instância que dá ordens para fazer o que é preciso, no sentido da adaptação a ela. De tal modo que o Estado quase podia desaparecer. A crise é um modo de gestão, de despolitização radical.





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