26 julho 2007

 

Ainda o caso Charrua

Disse ontem, a propósito do caso Charrua, que “o poder disciplinar é redundante, quando se dispõe de uma outra forma de poder de consequências mais drásticas”, querendo aludir ao poder de “sanear politicamente” uma pessoa, por incómoda ou por não pertencer ao nosso quadrante ideológico, ou ao nosso partido, ou por outra razão do género, mas é preciso que nos entendamos. O processo disciplinar, no caso, serviu de justificação, “a posterior”, do afastamento do funcionário e, por isso, nesse sentido, não foi redundante. A conclusão do processo foi que o Prof. Charrua praticou os factos que lhe eram imputados, ou seja, que ofendeu, por meio de injúrias, o Primeiro-Ministro. Apesar disso, não se lhe aplicou nenhuma sanção disciplinar, mas ficou subjacente, na mente dos leitores e dos ouvintes dos meios de comunicação social que ele, afinal, mereceu o afastamento. E tanto assim, que esse afastamento foi mantido, nisso se mostrando inflexível o ministério da Educação. Se alguém pensava que tal afastamento era provisório, que se desenganasse, porque a situação era irreversível. Não se ia manter no cargo que ocupava na DREN um funcionário que atacava o Primeiro-Ministro de forma injuriosa, como ficou provado no processo de inquérito, apesar de – passe o paradoxo – não se lhe ter aplicado nenhuma sanção disciplinar.
Por outro lado, o processo teve uma outra utilidade não despicienda, numa ocasião em que toda a gente contestava não só a delação que esteve na origem do caso, como também os “ataques à liberdade de expressão” e todo o procedimento seguido, a deixar transparecer um autoritarismo que este caso tornou paradigmático. Essa utilidade é de carácter retórico. O processo acabou também por servir, um pouco “à contre-coeur”, para uma afirmação retórica da importância da liberdade de expressão numa sociedade democrática, fazendo-se crer que era preferível salvar essa liberdade, a ter de punir disciplinarmente um funcionário por ter atacado injuriosamente o Primeiro-Ministro e isso poder deixar rastos que poderiam ser inibidores da falada liberdade de expressão.





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