23 maio 2007

 

Tanto zelo, não!

Não sei o que é que terá levado a governadora civil de Lisboa a marcar as eleições intercalares para a Câmara de Lisboa para o próximo dia 1 de Julho: se a vontade de repor com toda a urgência a normalidade no governo autárquico, de que Vital Moreira traçou ontem, nas páginas do “Público”, um retrato demolidor, mas certeiro, se o afã partidário de desenvencilhar o candidato escolhido por Sócrates de concorrentes incómodos (aquilo que alguém designou de “ganhar as eleições na secretaria”), se ambas as coisas. O certo é que o Tribunal Constitucional veio pôr um freio nessa ansiedade, anulando a data designada e propondo outra, que conciliasse a urgência com a necessidade de garantir o direito de participação política a todos os que quisessem concorrer às eleições. Não se esperava outra coisa de um tribunal, que tendo uma componente política, como se tem dito, é capaz de ser independente, e defender os valores do Estado de direito democrático.
Também não sei o que é que terá levado a directora-geral da Direcção Regional do Norte a suspender um professor de inglês por ter, ao que se diz, chalaceado em privado, num gabinete, com a licenciatura do primeiro-ministro. As personalidades públicas e, nomeadamente, os membros do governo sempre foram alvo de crítica, de considerações jocosas, de piadas, de ditos chocarreiros, de anedotas e de fantasias que os metem a ridículo. Isto é: nas sociedades democráticas, onde a liberdade de expressão não é apenas um emblema constitucional. Mesmo no tempo de Salazar, as piadas e as anedotas circulavam, ao menos em privado. É certo que as paredes tinham ouvidos, e toda a gente temia as propriedades auriculares das paredes, das cadeiras onde nos sentávamos, das mesas onde tomávamos café, dos vizinhos que fincavam cotovelos ao nosso lado. Mas já estamos a caminhar para aí? Ou será a tal “democracia claustrofóbica” de que falou Paulo Rangel a tramar as suas sob a forma de zelo funcional? É certo que a pessoa em causa não era uma pessoa qualquer, mas um professor de inglês ao serviço da referida Direcção Regional. Porém, como salienta o jornalista José Vítor Malheiros, num artigo justíssimamente indignado, também publicado no “Público” de ontem, a chalaça do professor foi em privado. E, sendo assim, é caso para perguntar se atitudes destas não favorecem o regresso ao país do respeitinho e do culto do chefe. É certo que o chefe é o primeiro-ministro, mas é só o primeiro-ministro, não o Senhor Professor Doutor Presidente do Conselho, de tão sinistras ressonâncias.





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