14 maio 2007

 

Notas desenquadradas, sobre televisão, comentadores e cientismos nacionais


O José da Grande Loja do Queijo Limiano a propósito de uma intervenção televisiva de um Barra da Costa (a que não assisti mas que ontem me foi relatada em termos muitos semelhantes aos do postal citado), constata com pertinência «O modo como estes indivíduos ganham acesso aos media, para relatar estranhezas desconhecidas do grande público, apresentadas como mistérios de lendas, são uma evidência em como a grande informação, em Portugal tem ainda um longo, longo caminho a percorrer, para atingir a credibilidade geral.»

Receio, contudo que o problema nacional vá bastante mais além e que o «longo, longo caminho a percorrer» não seja só da «grande informação».
Uma das cautelas essenciais na discussão numa sociedade aberta, muito dificultada quando em concreto se apresenta desdiferenciada, é a destrinça de planos, evitando juízos pré-concebidos sobre o trabalho de alguém por força das suas opções ideológicas e, o que vai sendo cada vez mais determinante, do personagem mediático que também encarna. De qualquer modo no caso deste Barra justiça deve ser feita, pois as suas opiniões televisivas não deslustram os respectivos galões científicos que pude, enquanto leigo, constatar em alguns textos fundamentais, alguns dos quais publicados na respeitável Revista Portuguesa de Ciência Criminal (publicação quadrimestral de referência na área do direito penal e, que já vai no ano 16º, fascículo 3).
Um exemplo que pode ser ressaltado é um artigo sob o título modesto, «Coordenadas históricas, formas e problemas actuais da criminologia» em que Barra revela a sua espessura como sociólogo, e não só, aliás é o próprio que esclarece que a ocupação de 31 páginas com um tema tão restrito se justifica na medida em que vai proporcionar aos seus leitores a «tripla perspectiva: do intelectual, do investigador e do cidadão anónimo»! (R.P.C.C., ano 10, fasc. 1º, 2000, p. 112) - e verdade seja dita que se seguem várias pérolas reveladoras do intelectual, do investigador e do cidadão anónimo, que, entretanto, já terá deixado de o ser.

Este Barra representará assim algo mais do que os meros comentadores de tipo futeboleiro (que existem sobre todas as áreas com interesse mediático). Com efeito, se noutros países as publicações de carácter científico são o espelho do escrutínio de subsistemas essenciais ao todo social e, no fundo o quadro da prática intelectual que aí se desenvolve – e os mecanismos existentes, em particular a avaliação «cega» (desconhecendo a identidade do autor do texto) a que os textos têm de se submeter antes da sua publicação devem ser vistos na sua dimensão funcional -, a ausência generalizada de mecanismos de controlo sobre os trabalhos publicados, eventualmente associada às enormes dificuldades para a sua implementação (até por défice de avaliadores), constitui também um indicador nada despiciendo sobre o panorama cultural e científico dos países que deles carecem ou que se dão a tais luxos.

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