16 agosto 2006

 

Guerra, dilemas e David Grossman


A situação actualmente vivida no Médio Oriente não pode deixar de afectar as nossas consciências, contudo estando essencialmente invadido por perplexidades e não tendo nenhum especial conhecimento sobre o tema, algum resíduo de sensatez determina que reserve as minhas opiniões para a discussão num espaço mais circunscrito do que a blogosfera. Acresce que, como ninguém gosta de etiquetas, o desconforto será maior para quem, tendo dúvidas, ao partilhá-las se arrisca a ser simultaneamente classificado de pró e anti, pois os mais convictos verão com natural desconfiança quaisquer interrogações que sejam deixadas no ar.
Por essa razão, apesar de resistir a «postar» «opinião» sobre o tema, quero a assumir uma perspectiva mais generosa sobre David Grossman do que a que a que resulta do postal de Maia Costa Contradições e desventuras de certos “pacifistas”.
Concordo integralmente com Maia Costa que a aplicação do rótulo de pacifista a um israelita que defende o Estado de Israel, que depende da utilização da força militar, é uma contradição nos termos (aliás que base existe para alguém ser classificado como "pacifista" sem a defesa da absoluta inadmissibilidade do uso da força militar).
Agora também me parece que a posição relativa do observador tem implicações no olhar por mais integro que ele seja. Assim, se relativamente às intervenções externas do Império, os cidadãos do centro do Império (EUA) e da sua franja (Europa) podem ler o que se passa a partir dos mesmos quadros compreensivos, em especial se têm afinidade ideológica, já não me parece tal afinidade permita que o conflito de um Estado (Israel), que a todo o tempo está a jogar a sua sobrevivência e a segurança dos seus nacionais (bem ou mal perspectivada), possa ser vista com os mesmos filtros por um cidadão desse Estado e por alguém estranho ao conflito (por maior que seja a comunhão cultural e ideológica que os ligue).
Em face disso, acho que o empenho cívico de Grossman é admirável, vindo de quem vem, e especialmente difícil. Também me parece que tendo em atenção a sua posição de israelita existe coerência, embora esta, como ele sublinha na entrevista abaixo referida, possa implicar que num dia se julgue que a pessoa não deve participar na iniciativa militar do seu país e noutro já se ache o contrário.
E se Grossman apoiou a acção militar no sul do Líbano (porque considerou que a mesma se justificava para a segurança do seu país e não para a paz do mundo), antes da morte do filho fez um corajoso apelo (com Amos Oz and A.B. Yehoshua) para a cessação das hostilidades. Em momento algum me parece que tenha agido por outros motivos que não os invocados.
Quanto às reflexões ambivalentes de Grossman que, além do mais, é um cultor da palavra limito-me a remeter para o que ele disse em dois outros momentos sobre questões difíceis para um israelita:
- a troca de argumentos, em Setembro de 2001, com Amos Oz a propósito da morte de líderes da Intifada pelo exército de Israel;
- entrevista realizada por Bill Moyers em Março de 2002, aquando da ofensiva de Israel nos campos de refugiados.

Porquê esta referências? Confesso que a racional admiração por alguém que estando num país (permanentemente) em guerra tenta, sem reserva mental, «olhar o outro», no caso é acompanhada pela dimensão emocional: nenhum pai merece aprender algo, ou deixar de aprender, através da morte violenta de um filho (e acho que as reflexões de Grossman revelam uma aguda consciência disso poder verificar-se... a todo o tempo).





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