02 junho 2006

 

Desinformar noticiando

A notícia de hoje do Público sobre as estatísticas da justiça de 2005 é um bom exemplo de desinformação. Não se duvida dos números indicados, que aliás são, ao que parece, recolhidos do relatório anual do Gabinete de Política Legislativa e Planeamento do MJ. A desinformação reside em algumas subtilezas que passo a apontar. Desde logo no título: o número astronómico de processos pendentes, apresentado secamente, desde logo induz uma imagem de desordem e caos no sector. Imagem que se avoluma logo no primeiro parágrafo com a "acusação" de aumento significativo das pendências em 2005 relativamente aos anos anteriores, assim como da duração média dos processos.
Contudo, uma leitura atenta da notícia revela que a grande pendência é relativa à jurisdição cível e que aí somente as execuções constituem mais de dois terços das pendências. Na área criminal o aumento dos processos pendentes verifica-se gradualmente desde 2000, mas já na justiça laboral os números estabilizaram.
E quanto à referida duração média dos processos, apenas na área cível houve aumento da duração média, verificando-se tendência contrária nas restantes jurisdições. E nada se diz, por exemplo, sobre os tribunais superiores, onde a duração média tem diminuído acentuadamente, como facilmente se pode comprovar.
Em resumo: lida com atenção a notícia, ela própria revela uma realidade muito mais complexa do que é enunciado no título e no parágrafo inicial. Mas um leitor pouco ou mesmo medianamente atento tenderá a ler e assimilar a "mensagem" inicialmente proposta, mensagem aliás confirmativa da percepção corrente na opinião pública: que a justiça "não funciona".
A "notícia" funciona assim não como veículo de factos (as estatísticas da justiça em 2005), mas como ratificação de estereótipos consolidados nesta matéria.





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