16 maio 2006

 

As intermitências da separação de poderes

Eu sinceramente também acho que a questão do encerramento das maternidades é uma matéria de natureza político-administrativa, porque situada no âmbito da promoção de um determinado programa de saúde, e que portanto o Governo é o órgão de soberania competente para decidir. Aos tribunais administrativos caberá apenas o controlo da legalidade dos actos, nunca da conveniência dessa mesma política. Cada poder com as suas competências, de acordo com o princípio sagrado da separação de poderes.
Admiro-me, porém, que só quando o poder judicial eventualmente pisa o risco (e não estou a dizer que o pisou neste caso porque não conheço as decisões dos tribunais administrativos nem a sua fundamentação) é que vejo convocado o princípio da separação de poderes por um constitucionalista tão responsável como Vital Moreira.
Mas então quando a Assembleia da República "chamou" o Procurador-Geral para "prestar contas" na Comissão de Assuntos Constitucionais (que bem devia conhecer a Constituição, dado o nome que a distingue), quando a mesma distinta comissão aceitou ouvir os arguidos do Envelope não sei quantos, na pendência do inquérito criminal, quando foi anunciada a proposta governamental de criar uma comissão administrativa para controlo das escutas em processo criminal (e basta de exemplos), quando portanto foram praticadas ou anunciadas claras intromissões de outros poderes no território do judiciário, por que não se ouviu a sua voz (e não estou a falar de outras vozes, porque essas não chegam ao céu)? Será que só há violação da separação de poderes quando é o judicial a exceder o seu domínio? Não estará aqui mais uma manifestação bem evidente da indelével cultura jacobina que enforma as elites pensantes apoiantes do actual Governo (e não só)?





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